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O museu do louvre pau-brazyl, projeto artístico-curatorial, realizou uma trilogia de exposições entre 2016 e 2020 no edifício Louvre, localizado na avenida São Luís, 192, República, São Paulo.

João Artacho Jurado, empreendedor e responsável por projetar todos os prédios da incorporadora Monções, em que era sócio com seu irmão Aurélio Jurado Artacho, ao conceber o “Louvre”, no final dos anos 1940, concedeu ao edifício uma narrativa única, cujo peso simbólico de seu nome se estende por seus 9 blocos de apartamentos.

Os quatro blocos da frente foram batizados de Velázquez, Renoir, Rembrandt e Da Vinci; e cada hall social decorado com duas reproduções de obras do respectivo artista. Os cinco blocos restantes localizados nos fundos não possuem nenhuma identificação, tampouco gravuras; mas, por meio de uma pesquisa no arquivo de plantas baixas do condomínio e de um anúncio de vendas dos apartamentos em um jornal da época foi possível recuperar o pintor negligenciado: o brasileiro Pedro Américo. Intencionais ou não, essas escolhas nos dão margem para fabular, imaginando uma História da Arte e uma História da Colonização presentes nesse museu-trouvé. São esses os dois fluxos principais que alimentam a pulsão do louvre dentro do Louvre.

O movimento curatorial ao longo desses anos funcionou como um scanner no edifício, reconhecendo e revelando as suas diversas camadas. A primeira edição 9 do 9 (2016) parte da avenida-boulevard para dentro do prédio, instaurando a franquia-ficção com uma exposição coletiva em meio aos corredores palacianos do mezanino, espaços públicos durante o horário comercial. Já a segunda, Desdito (2017) com a exposição individual de Lais Myrrha, se debruça sobre o bloco dos fundos, o apagamento do artista brasileiro, as áreas de serviço e os subsolos do edifício e da História do Brasil.

A trilogia se encerra com o 3º ato: o verso, coletiva realizada em abril de 2019, em que o gesto curatorial foi inverter a fachada do Louvre. Os seus versos, junto aos dos edifícios Copan e São Luiz Plaza, formam um coliseu ao redor de um terreno baldio em meio ao triângulo entre as avenidas São Luís e Ipiranga e a rua da Consolação.

O palco, esse terreno, pertence à Universidade de São Paulo, adquirido em 2011 durante a gestão de João Grandino Rodas com intuito de transferir para fora do campus Butantã parte dos órgãos administrativos da USP. A compra se processou num contexto em que o Reitor convivia com muitas críticas ao desperdício e desvio de função no uso de verbas, contestadas com sucessivas ocupações de estudantes no edifício da Reitoria. Esse bem público já exerceu a função de estacionamento e em 2013 a Universidade começou a executar o projeto arquitetônico da Procuradoria da Reitoria. Vários subsolos e toda a estrutura já estavam construídos, quando, em 2014, a obra foi interrompida e a fundação do prédio soterrada completamente. O lote, um dos últimos remanescentes nesta região da cidade, está, desde então, à venda.

A princípio, a intenção era que as intervenções e obras de arte pudessem se apoiar temporariamente no terreno e que esse bem público ficasse aberto à sociedade. Durante mais de um ano manteve-se contato com a Universidade, que ao fim de uma epopeia por essa autorização, proibiu o uso do espaço. Então, esse palco vazio, bloqueado, cerceado, tornou-se um elemento fundamental para esta edição do projeto. Ao contrário de uma limitação, a restrição fez o ato transbordar com trabalhos de arte que ocuparam as frestas, as superfícies (empenas, muros, calçadas, janelas) e o ar – os espaços possíveis dentro da tridimensionalidade formada por esse quarteirão-triângulo.

Além de alterar a relação entre frente e fundo, criando uma nova perspectiva ao Louvre, o 3º ato: o verso usa esse palco baldio para dar caráter de cena aos gestos, sons, luzes e movimentos deste teatro de arena, em que os milhares de moradores em suas janelas são tanto público como personagem convivendo por 9 dias com proposições artísticas.

A exposição terminou com um recado da Universidade: a construção na entrada do terreno de um muro de alvenaria coberto com arame farpado que substitui o frágil tapume de alumínio existente, obra iniciada no dia seguinte ao final do 3º ato.

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